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Representações Culturais do Outro nas Literaturas de Língua Inglesa

Maria Conceição Monteiro

Tereza Marques de Oliveira Lima

(organizadoras)


Representações Culturais do Outro nas Literaturas de Língua Inglesa engloba ensaios que versam sobre os mais variados assuntos, tendo como ponto axial a representação apreendida enquanto processo de significações culturais.

No primeiro capítulo intitulado "Discurso, Deslocamento e Transgressão", Roberto Acízelo, em "O ´Caso´ Teresa Margarida da Silva e Orta, ou a Propósito da Distância entre Boas Letras e Literatura" analisa o romance da referida escritora, Máximas de Virtude e Formosura, que publicado em 1752 seria o primeiro romance da literatura brasileira, uma vez que se trataria de produção muito anterior às obras geralmente apontadas como pioneiras no gênero. O autor mostra também, que visto sob a ótica da crítica feminista, seria uma obra relegada ao esquecimento, por tratar-se de texto produzido por uma mulher em uma sociedade cuja organização patriarcal reserva aos homens todos os destacados papéis públicos, entre os quais o de escritor.

Ainda no século XVIII, vê-se uma problemática similar no ensaio "The Female Quixote: Desejo e Imaginação versus Realismo Prescritivo" no qual Conceição Monteiro faz um estudo comparado entre a obra citada e Dom Quixote, contrapondo uma certa crítica feminista que analisa a heroicização como forma de reinscrição da mulher no sistema repressivo. Para a autora, a heroína de The Female Quixote interfere com os mecanismos do sistema reinscrevendo-se em uma narrativa que desnuda, desconstrói e subverte os códigos sociais do comportamento de gênero, assegurando, assim, o seu espaço e a sua voz. Este ensaio discute também como Charlotte Lennox, ao usar este gênero literário, consegue expor as limitações da vida da mulher no século XVIII, transgredindo, ao mesmo tempo, as normas sociais e literárias.

No segundo capítulo "Contatos, Contrastes", Humberto Fernandes Machado mostra em "As Idéias de Procriação entre os Cafeicultores Escravistas Fluminenses" como a carência de mão-de-obra escrava nas fazendas de café do Vale do Paraíba fluminense, devido ao alto índice de mortalidade provocada pela estrutura coercitiva levou alguns senhores a exaltar as medidas incentivadoras de procriação em vigência em algumas regiões do Sul dos Estados Unidos.

Heloisa Toller Gomes em "Espaços Reais, Espaços Míticos:o Sul no Imaginário Norte-Americano" analisa The Awakening, de Kate Chopin, Cane, de Jean Toomer e As I Lay Dying, de William Faulkner, mostrando como o Sul dos Estados Unidos tem sido revisitado para elaboração literária de problemáticas de grupos sociais diversos, tais como, a classe senhorial, a população afro-descendente e os brancos pobres. A autora desvela o entrelaçamento da dramática herança histórica do Sul e a força do discurso ficcional em que o imaginário adentra o espaço real construindo espaços míticos.

Em "Chicago: uma Cidade-Fronteira", Jorge Luis Barbosa vê esta cidade como um território de encontros e conflitos socioculturais. Por ser cidade-fronteira, Chicago pode ser concebida como uma síntese de experiências étnicas e estéticas radicais da sociedade urbana norte-americana.

Tereza Marques de Oliveira Lima em "Que Mulher É Essa? Novas Vozes Femininas do Conto Sulista Norte-Americano" analisa a representação do sujeito feminino no conto sulista contemporâneo. A partir da criação do mito do Velho Sul e sua relação com o sistema patriarcal sulista, a autora mostra como as escritoras sulistas retratam a permanência tensionante dos ideais antebellum em uma trajetória de cem anos, nos contos "Dare's Gift",de Ellen Glasgow, "First Dark", de Elizabeth Spencer e "Shiloh" de Bobbie Ann Mason. Este percurso, em diferentes momentos históricos, evidencia a gradativa procura de uma identidade que permitisse que a mulher sulista construísse o seu próprio caminho, norteada por novos scripts culturais em que a lady dá lugar a uma mulher que almeja mais do que o mito lhe oferecia: a liberdade.

No capítulo "Literaturas no Contexto de Gays and Lesbians Studies", Eliane Borges Berutti discute o envolvimento de gays e lésbicas na epidemia de AIDS nos Estados Unidos. No seu ensaio "Gays, Lésbicas e AIDS: uma Perspectiva Queer", a autora analisa como o movimento social das minorias sexuais se torna visível a partir dos Stonewall riots (1979), ajudando na construção do debate teórico sobre essas minorias assim como os queer studies. Usando textos sobre a temática do ativismo gay e lésbico nos EUA, seu estudo estabelece um recorte interdisciplinar com o cruzamento de textos literários post-Stonewall.

Peonia Viana Guedes em "Desafiando os Mitos de Feminilidade: o Grotesco e o Erótico em The Passion e em Nights at the Circus", demonstra como essas obras exploram a dimensão multifacetada da sexualidade feminina, problematizando as definições convencionais de feminilidade. Ao reescrever o corpo feminino para além de suas representações precodificadas Jeanette Winterson e Angela Carter criam personagens que subvertem os modelos tradicionais de mulher, oferecendo novos padrões de identidade e sexualidade.
Mário César Lugarinho em "Ecos Beatniks em Portugal: Al Berto", apresenta a obra do poeta português e seu diálogo com a literatura Beatnik. Tanto a intinerância presente em On the Road de Jack Kerouac, e a decadência em "Howl", de Ginsberg, são aspectos estruturadores de sua obra que lhe conferem um destaque na literatura portuguesa pós-1974.

Em "Homoerotismo e Alteridade em Julien Green", José Carlos Barcellos propõe uma reflexão acerca das relações entre homoerotismo e alteridade em alguns contos e novelas produzidos no início da carreira literária deste escritor francês de origem norte-americana. Nas obras enfocadas, a figura do outro é sempre misteriosa e ambígüa, o que leva a uma crise da subjetividade da personagem central. A opção por procedimentos estéticos na linha do fantástico aparece nesses textos como uma forma de se configurar literáriamente um segredo cuja possível vinculação com o homoerotismo é insinuada pontualmente. Para o autor deste ensaio o estudo destas narrativas pode ensejar discussões sobre a tematização do desejo erótico que permeou a literatura das primeiras décadas do século XX.

No capítulo "O Teatro: Figuras Dis-cursivas", o ensaio de José Roberto O´Shea "Dessacralizando o `Verbo' Shakespeariano: Tradução Lingüística e Cultural" discute maneiras em que a tradução pode promover o que define como a dessacralização do verbo shakespeariano. O autor questiona se as obras do bardo deveriam ser ainda consideradas textos sagrados, escrituras seculares que substituem a Bíblia no nosso consciente secularizado. Como em tradução Shakespeare é destituído de seu idioma, O´Shea afirma que seu Verbo é necessariamente dessacralizado, deslocado, lingüística e culturalmente.

Victor Hugo Adler Pereira em "Electra nas Encruzilhadas Culturais" focaliza comparativamente modernas versões dramatúrgicas do mito de Electra oriundas de três pontos diferentes das Américas: a trilogia Mourning Becomes Electra (1931) de Eugene O´Neill; Electra Garrigó (1941) do cubano Virgilio Piñera; e Senhora dos Afogados (1947) de Nelson Rodrigues. Para o autor, a análise das transformações a que se submete a Oréstia de Ésquilo nessas três versões aponta a recorrência e contrastes na configuração do sujeito e examina suas relações com questões culturais como a difusão das teorias freudianas no continente.

No capítulo "Identidades e Imagens na Literatura Anglo-Irlandesa", Munira Mutran no ensaio "O Prato Quebrado: Irlanda e Inglaterra", conclue que os oitocentos anos de domínio britânico foram determinantes para que toda literatura produzida pela Irlanda reflita o anseio de se auto-definir ao mesmo tempo que define o outro. Segundo a autora, escritores como Thackeray, Somerville and Ross, Joyce e mesmo Yeats, em sua fase romântica, não conseguem livrar-se de estereótipos. A partir de 1922, porém, um ponto de vista realista e objetivo, torna-se predominante, como pode ser detectado na obra de Sean O´Faolain.

Magda Velloso Fernandes de Tolentino no ensaio " A Irlandesidade de Joyce em um Conto da Vida Pública: ´Dia de Hera na Sede do Comitê´" apoiando-se em conceitos teóricos de Homi Bhabha, em seus estudos sobre a nação moderna, mostra como James Joyce se posiciona, de forma irônica, face aos irlandeses enquanto súditos dos ingleses, no início do século XX, observando os eventos e a linguagem do referido conto da coletânea Dublinenses.

Em "A Identidade Irlandesa no Palco", Cléa Fernandes Ramos Valle aponta que a criação do Teatro Nacionalista Irlandês foi um marco na História do país. Tudo é típico: as pessoas, os lugares e as situações em que se apresentam. Segundo a crítica vigente, a preocupação primeira do teatro Irlandês é com seu povo e, depois, com o resto da humanidade. Mas é, sobretudo, uma dramaturgia que rompe fronteiras, atingindo a todos os homens que anseiam por liberdade.

Maria Helena Kopschitz mostra em "Um Outro Prometeu: A Saga de Cuchulain no Teatro de W. B. Yeats", que no manifesto assinado por Yeats, o poeta busca um novo Prometeu, um Prometeu Irlandês, um herói que pertencesse ao imaginário de seu povo. E é em Cuchulain, o maior herói da lenda irlandesa, que ele vai encontrá-lo.

No capítulo "Espaços do Outro", Glaucia Renate Gonçalves em "A Representação da Comunidade Gullah na Ficção Afro-Americana", discute como essa comunidade das Sea Islands, uma cadeia de ilhas situada no litoral dos estados da Carolina do Sul e Georgia, é bastante distinta de qualquer outra nos Estados Unidos. Neste ensaio, a autora demonstra como a escritora afro-americana Gloria Naylor retrata a comunidade Gullah e a transposição da sua oralidade crioula para o texto literário, em seu romance Mamma Day, com o intuito de reforçar o sentimento de identidade cultural dos habitantes das ilhas e enfatizar a heterogeneidade norte- americana.

Ruth Persice Nogueira no seu ensaio "A Estrutura Polifônica de Ragtime", sugere que E. L. Doctorow consegue orquestrar neste romance várias vozes: de mulheres, de negros e, especialmente, de imigrantes, em uma polifonia em que se encontram desarmonias, contrapontos e as fugas na conflituosa América do final do século XIX. Mesclando personagens históricas e fictícias, o escritor revela como a dinâmica social vigente vai atuar na criação e na transformação do que se tornaria a sociedade americana do século XX.

Em "Um Dia de Fúria em Los Angeles: Nostalgia, Paranóia e Desterritorialização Cultural em `Falling Down'", Sonia Torres mostra que os espaços urbanos atuais funcionam como ponto de referência para investigar as reformulações de pertencimento nacional, cidadania e territorialidade. No filme "Falling Down", de Joel Schumacher, que a recepção considerou como uma revanche da classe média, a autora analisa o discurso nostálgico de nação subjacente aos diversos encontros da personagem central com a alteridade.

O último ensaio da antologia é o de Nélia Bastos que em " O Outro na Ficção de Joy Kogawa", analisa o romance Obasan, cuja estrutura narratológica depende da intertextualidade e do uso de convenções de vários gêneros literários, como as do romance epistolar e da autobiografia. A autora discute a questão da descontinuidade, da polifonia, assim como da representação na ficção canadense contemporânea, definida por Linda Hutcheon como metaficção historiográfica.

Finalizando, gostaríamos de agradecer a todos os participantes do III Seminário de Literaturas de Língua Inglesa - SELLI, realizado na UFF, em setembro de 2000, que colaboraram com os seus ensaios na feitura deste livro.


Compra pela Internet:

Preço: R$ 20,00


Lançamento na Livraria da Travessa — Rua Visconde de Pirajá 462, Ipanema —, no dia 12 de março de 2002, às 19:30 horas

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